quinta-feira

foi precisamente hoje que voltei ao mesmo lugar.
havia a mão aberta e a ferida seca
duas colunas de vapor quente
ao meio do espelho.
junto ao portão, quando partes? e aproximei-me
um pouco dos olhos, da respiração que fica
quando tropeças numa pedra e sorris
ou mesmo quando sobes a rua
e vês o luto das pequenas margens.
reconstróis-me o canto do lábio? e eu inspirava
de um lado ao outro a esquadria
do tejo, o golpe e os segundos
todos das tardes, o ar da tua boca
e as fissuras ardidas da madeira.
foi precisamente hoje que voltei.
a luz repetiu-se dentro dos mesmos objectos.
os dedos alinhados a apontar para cima
quase tudo a entrar sem esforço.
deixei que fosses a gordura no vidro
o caroço polido de uma cereja.

quarta-feira


























às vezes sento-me a olhar o chão
a ver as paredes azuis, a contar o tempo
a lembrar o sangue nos telhados e as ruas onde nos cruzamos.
fico apenas a enrolar um fio do meu cabelo à volta
do dedo mindinho e a pensar, um triângulo
na direcção do lugar onde devo morrer.
os traços imitam as estações.



fotografia de Gundega Dege.

sexta-feira

1,2 e 3.



















explicas-me a regra do jogo?
saltamos os dois do segundo degrau
para um outro mais abaixo
o quarto degrau, aquele ali, apontas.
dizes que ele é branco e que podemos
sorrir se lá chegarmos
ao mesmo tempo.


fotografia de susana miguel.